
De repente surge em minha frente, um amigo querido que não via a tempos, num total desencontro. Mas lá estávamos, juntos agora, por um acaso feliz do destino. Entre assuntos, me pergunta: como está sua arte? Falar do seu trabalho, não é asssunto que agrada muito ao artista, principalmente numa conversinha de esquina, mas pelo meu amigo...
Bem, estou pesquisando alguns materiais novos e fui destilando minha obra-trabalho para ele como se fosse a coisa mais natural do mundo. E pra mim realmente era. Eis que de repente ele começa a rir, o que me deixou meio indignado, para não dizer puto da cara, e perguntei o que estava causando tanta graça... Ele acelerou na gargalhada, o que me levou a achar graça também, estava eu rindo sem saber do que!
- Tato, como ele me chama, voce já percebeu que falas de arte com um cego?!
Confesso que fiquei constrangido, pois não lembrei que meu amigo é deficiente visual, termo muito preconceituoso segundo ele. Esqueci que o cara, meu querido amigo, era cego. Restava-me pedir desculpa.
-Não Tato, continue, apenas percebi que voce esqueceu que não enxergo, mas estou entendo perfeitamente, não tenho visão, mas consigo trazer para meu mundo o seu.
E isso era realmente impressionante, ele estava fazendo uma leitura de minha obra com o que eu relatava, me levando a perceber: não é isso que buscamos na arte? Levar o expectador a uma visão mais sutil das coisas, sem tanta expectativa de compreensão, mas de sensação. Conclui que estava naquele momento falando com a pessoa certa, afinal a tantos que enxergam e nada veem, por que alguém que não enxerga não pode ver?
Ele corta minhas conclusões para contar-me de um encontro de cegos, surdos e mudos que ele teve em Belo Horizonte, onde haveria a apresentação de um coral de surdos-mudos. Eu, claro, achei incrivel.
- Tato, fizemos uma excurção. Quase 17 horas dentro de um onibus para nos colocarem sentados, novamente, agora num teatro, numa sala escura, onde haveria a tal apresentação. Uma moça, pela voz, deveria ser muito gostosa, anunciou a apresentação do coral de surdos-mudos. Eu já quase 4 horas sentado no teatro fiquei esperando..... esperando.... havia um fundo musical orquestrado para aliviar minha espera, quando de repente ouvi os aplausos incessantes, acabava a aparesentação do coral que executou músicas do Roberto Carlos, usando linguagens de sinais - libra. Fala prá mim .... não foi um programa prá cego dormir?
Foi minha vez de rir, melhor, gargalhar...
Depois de tantos assuntos, resolvi levá-lo para sua casa, uma vez que já estava ficando tarde, e fomos nós... no caminho me disse: taí meu amigo, uma coisa que nunca fiz, dirigir! Rimos muito e prometi ensiná-lo... rsrsrsrs. Pronto,chegamos! Vamos subir para tomar um cafezinho? Convite inrrecusável, para fã de café como eu. Pegamos o elevador, no apartamento, abriu a porta e disse:
- Entre Tato, fique a vontade!
Entrei... a porta fechou-se em minhas costa, ele se dirigiu para cozinha, e eu... eu fiquei em uma sala totalmente desconhecida e no escuro... foi a vez dele cometer a gafe ou vingança?!
mk
*Texto escrito para o blog Gato Ensacado, que tenho a honra de participar a convite de seu criador o Jornalista e Escritor Manoel Soares Magalhães.